segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Ementa





O que se passa, eu não sei. Sempre pensei saber como seriam as minhas decisões, como deveria reagir perante qualquer situação, embora esteja ciente de que nem tudo corre como imaginamos, ou como os outros imaginam. Sempre me imaginei a vivenciar todas as catástrofes; o que fazer, como fazer, quando o fazer. A quem recorrer. Hoje em dia reviro os olhos e levo as mãos à cabeça. Como é possível correr (quase) tudo de forma diferente? Impressiono-me por não ter esse tipo de poder, de amar o tempo enquanto ele me vai aquecendo e aconchegando à noite. É verdade que enrolamos sempre uma perna na outra, à noite, faça frio ou calor. Seja Verão ou Inverno. E Hoje? Hoje dói. Hoje escondo as mãos entre as pernas enroladas. Hoje não consigo adormecer com a cabeça destapada. Não consigo. Tenho, muito sinceramente, medo que me agarrem os cabelos e que os levem para sei lá onde. Que me deixem a cabeça nua, sem as habituais descargas morfológicas; recargas ideológicas. Hoje pica-me, sinto-me como se tivesse nascido para ser hospedeiro deste formigueiro atordoador. Deste vendedor de desilusões cuja compra se dirige directamente, para mim. E porquê? Porque pago o que for preciso, para não me verem à deriva com as entranhas a flutuar. Já basta a água turva que me molha os ouvidos. Hoje arranha. Arranha-me a vontade. 


Resumi a minha vida ao simples facto de que um fato não me serve. Melhor: Não poderia nunca, servir. Detesto gravatas e sapatos apertados. Não gosto de sentir a pele embrulhada, amarrotada. Não gosto de me ter que espreguiçar por uma força maior, sem que seja por a minha maior força. Fora disso, sempre me pensei decisivo. Inciso, como por exemplo chegar a um restaurante e ser preciso na escolha. De nem ser preciso, olhar para a carta e rasgar os olhos pelo que está disponível. Rasgo-me pelo que me agrada, ou pelo que me poderá agradar. E agrada-me agradar aos outros se a eles lhes agrada. E hoje? Hoje nada me agrada. Nem coragem, nem humildade. Nem o bitoque, nem bacalhau à Brás, nem a especialidade da casa.


Hoje? Hoje nada me agrada.