segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Dark room, no cameras. Pt - II

Tenho frio.

Lembro-me do teu nome tantas vezes... Mais do que aquelas que me obrigam a dizer o meu, embora me esqueça sempre de referir o último; André, apenas. Basta? O meu subconsciente diz que sim, que não preciso de me desvendar mais, perante ninguém. Di-lo com as sílabas do teu nome penduradas ao pescoço, escritas com cor de limão, num placar fino mas enorme. Tão grande que lhe obriga a caminhar desajeitadamente, na minha direcção.

Acreditavas se te dissesse que nunca o cumprimentei? Nem um Olá ou sequer um Bom Dia. Vejo-o imensas vezes na avenida, do outro lado da estrada. Levanto o braço mas finjo que arregacei a manga; não me fala. Não nos falamos. Hoje decidiu fazê-lo, surpreendeu-me. Agarrou-me no braço, cravando as unhas na minha pele e proferiu em tom rouco:

- Agora é a tua vez de o envergares. – Disse, baixando a cabeça para que pudesse retirar o placar. – Fá-lo emblema. Passa com a caneta no rebordo de cada letra, todos os dias de manhã. Sem falhas! Lembra-te que se não o fizeres, retirar-to-ão, sem quaisquer tipos de aviso prévio.
Tremi. Senti-me como se estivesse em cima de um escadote no topo de uma montanha russa. Mordi o lábio para voltar à realidade mas, nem sequer cheguei a sair dela.
…És tu?



Tenho frio. Trouxe algumas páginas do teu caderno secreto comigo, para a varanda. Espero que não te importes. Espalhei-as em cima da cama, ao meu lado. Estou de barriga para baixo com as pernas no ar, de tornozelos cruzados. Normalmente doem-me os cotovelos nesta posição, mas hoje não. Surpreendentemente não sinto qualquer dormência, física ou psicológica. Costumo até mordiscar a ponta da caneta, mas hoje, não. Passo-a pelos lábios sem dar conta de que, pelo menos, já tenha passado os olhos pela tua caligrafia ínfimas vezes. Está escuro e só tenho o ecrã do portátil a franzir-me os olhos, mas consigo lê-la. Consigo ler-te. Consigo ter-te.

Prometi-te frases escritas a fluorescente mas acho que vou quebrar a promessa. Não aguento. Tenho toneladas de tinta pré-fabricada por ti a rebentarem-me as paredes desta fábrica vermelha, em forma de coração. Gritam por página atrás de página com números próximos dos três dígitos.
É aqui que eu me perco, por ti. Por mim, nos meus pensamentos por ti. Tenho mais de ti em mim do que aquilo que tu possas imaginar; uma manga em cada braço, tatuados, trabalhando em equipa. Um agarra no caderno, o outro escreve. Um agarra-te no queixo, o outro puxa-te na minha direcção. Um mima a tua nuca, o outro desliza na tua bochecha.


É desta que abrimos as persianas?
É desta que te sinto?