segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Heavenly sweet.

Sou um escritor da treta.

Pode até parecer idiotice, mas tenho mantido a mesma caneta comigo. Desde o início, até hoje. Até agora. Por vezes falha, não vou mentir. Tem dias em que se arma em chata e decide escrever em braile, vai-se lá perceber o porquê. Mas a verdade é que tem permanecido cá, comigo, até hoje. Até agora. No entanto, não diluí a certeza de que sou um escritor da treta.
Não sei escrever. Não me sei escrever. Não te sei escrever nem nos sei escrever… Embora esteja habituado a esta espécie de ervas daninhas que me consomem a imaginação, imagino-te. Tenho-te. Sinto-me feliz por teres deixado a tua gargalhada comigo, permite-me imaginar-te. Permite-me ter-te. Permite-me permanecer o que sempre fui. Mas o mais importante: Ajuda-me a manter os pés longe daquilo a que chamo de areias movediças. De um corpo inanimado com a mente à deriva, a boiar em pensamentos esterilizados. Sentimentos monocromáticos. Esse teu sorriso desdentado obriga-me a lembrar-me a lembrar-te. A acenar-te quando entro pela porta da frente, da nossa casa mágica com quatro piscinas às cores.
Chega a uma altura das nossas vidas, em que nos dizem que temos que seguir em frente. Aprender a viver a vida e a ultrapassar os problemas. Está errado. Está tão errado como o pensar que devemos saber fazê-lo, que nos pode ser ensinado. Eu não quero saber escrever. Não te quero saber escrever e muito menos irei querer, saber escrever sobre nós. Não quero deixar de riscar e escrever ao lado, ou por cima. Não me interessam técnicas ou tão pouco referências literárias. Não me interessam ensinamentos. Não quero aprender a viver.
Chega a uma altura das nossas vidas, em que desejamos que alguém dê pela nossa falta. Está correcto. Faz-nos sentir certos quando nos procuram. Faz-nos sentir que estamos cá, presentes. Que não fazemos só parte de um livro escrito por alguém que sabe escrever. Que nos soube escrever. Já eu, não o sei. Só te sei a ti e de alguma forma, parece confortar-me. Parece agradar-me ao convencer-me que o faço de forma errada.



Queres saber uma coisa, Anna?
Eu sou um escritor da treta. Sou. Tenho que admiti-lo e nada melhor do que uma plateia de grilos para o testemunharem, a esta hora da madrugada. Tenho uma dezena de cadernos cheios de letra feia e outra meia dezena, preenchidos com poemas enfadonhos e rimas ridículas. Todos rabiscados numa tentativa impotente e desgostosa de descrever o que é a dor, e o amor. Convenço-te se te disser que és as linhas mais bonitas que um caderno pode ter? Não cores, minha pequenina. És a minha melhor memória. A minha melhor história.




1 month, darling. I'll be up there in a minute, I promise.

domingo, 17 de agosto de 2014

Boreal.



Não é espanto que dê por mim cá fora, nas madrugadas de Agosto. Que contemple no som das árvores o vento que de mim sopra. Das sobras que ficam em mim por se esquecerem de raspar o fundo. Não é espanto.
O caderno vai ficando menos branco a cada solavanco emocional. A cada minuto gasto sentado neste banco, cá fora, com as costas na diagonal. Numa espiral intemporal que me tende a fazer desaparecer, para além das árvores. Para ser franco, estou pronto para outro branco. Estou pronto para outro caderno. Estou demasiado agarrado ao velho, e isso, não é de espantar. Por mais que o tranque nunca o tranco e isso, é preocupante. Agora, é preocupante.

Sinto-me preso a tanta folha tanto que a cola nelas posta, são as minhas próprias costas. Numa balbúrdia de notas e post-its, de uma maneira ou de outra lá me vou recolhendo, lá me vou encontrando. Mas, não é espanto… é o meu próprio branco. É o meu próprio branco, recheado e sobrelotado de pedacinhos de alma. De pessoas obliteradas por lembranças cuja maioria, ficaram mal resolvidas. Estou mal resolvido.
Não é espanto, que o Agosto estranhe quando não o acompanho nas suas madrugadas. De caneta na mão a preencher folhas riscadas, ao som de ninguém. Hoje é com o nariz entupido, pouca sorte. Respiro só pela boca como se tivesse dois dedos a apertarem-me as narinas, pouca sorte. Vou buscar letras ao peito mas nem uma que vem solta, todas enleadas. Pouca sorte.

Custa-me mais olhar para o meu cão deitado na sua cama, do que para caderno. Faz sentido? Faço eu sentido quando te escrevo sem saberes? Sem sequer pensares, que é para ti? Sem sequer sonhares, que sou para ti? Não é espanto, não saberes. Mas ele sabe, o caderno sabe. Melhor que tu e até melhor que eu, atrevo-me a dizer. Sabe-nos melhor do que eu próprio alguma vez saberei. Do tanto que eu não te implorei, ou agarrei. Do tanto que eu não sei, ou te soubesse.

Ronda à volta dos 3-4 minutos. É o tempo que o vento demora até o próximo chegar. Aquele breve silêncio que faz com que as árvores pareçam mais pequenas. Aquela breve pausa que me obriga também a parar, para as respeitar.



Afinal, não somos só nós que gostamos de respirar fundo.